Noite alta, madrugada

Noite alta, madrugada
Quando vai amanhecer
Capoeira se prepara
Pois tem muito o que fazer
Bater cabeça no tronco
Pede licença a Oxóssi
Mantem o pensamento forte
Pra na mata poder entrar
Ele vai apanhar biriba
Pra fazer seu berimbau
Ele vai apanhar biriba
Pra fazer seu berimbau
Ele vai apanhar biriba
Pra fazer seu berimbau

(autor desconhecido)


De angola

Na pancada do pandeiro
Na virada da viola
No raspar do reco-reco
Tem balanço de angola
As cantigas vão saindo
A língua nunca se enrola
Vai mansinho ou vai ligeiro
É acalanto de angola
O corpo segue mexendo
Parece feito de mola
Faz o que não imagina
É lambuzo de angola
Mas não se engane caranguejo
Cuidado siri-patola
Camarão bobo a onda leva
Na tarrafa de angola
Tem que ter discernimento
Precisa miolo na cachola
Ou escorrega no dendê
E na rasteira de angola
Enfrentando onda forte
Ou enfrentando marola
Pequeno derruba grande
Na mandinga de angola

“Raça branca”: uma invenção do século XVII

Transcrição:

Quando olhamos em volta e vemos hoje em nossa política um homem branco rico contando a pessoas brancas da classe trabalhadora que seu problema são as pessoas pretas e marrons, precisamos compreender o pedigree histórico de que isso é simbólico de todo a história da política racial e de classe na América.

A história dos brancos ricos dizendo à classe trabalhadora branca pobre que seu problema são os negros e pardos começou nos anos 1600. Até cerca de 1670 não havia tal coisa como “raça branca”, pelo menos não reconhecida como tal e chamada como tal.

Não é o que pessoas de ascendência européia não existissem. Quando eles estavam na Europa eles eram ingleses, eles eram irlandeses, eles eram escoceses. Fossem o que fossem eles não eram “brancos”. Só nas colônias nos tornamos “brancos” e por uma razão muito específica: porque naqueles primeiros anos do período colonial onde você tinha servos brancos contratados um nível acima dos escravizados e você tinha africanos escravizados e seus descendentes.

Nos primeiros anos das colônias essas pessoas frequentemente viam seus interesses como sendo comuns a todos eles, percebiam que eles estavam sendo f*didos pelos mesmos proprietários de terras – as mesmas elite contra as quais eles fermentaram várias rebeliões como a Rebelião de Bacon na Virgínia e outras.

Como resultado, a elite das colônias percebeu que tinha que descobrir uma maneira de trazer as pessoas de ascendência europeia para o seu lado, então criaram essa mentalidade que dizia que “você é agora um membro da raça branca e está no nosso time. Você está vestindo o nosso uniforme, mesmo que seja o último do banco de reserva e não possa nunca entrar no nosso jogo. Então começaram a colocar os agora chamados “brancos” em “patrulhas de escravos” – sem lhes dar qualquer qualquer terra ou qualquer poder real exceto o poder de controlar pessoas de cor.

É por isso que as pessoas de cor dizem, e estão certas nisso, de que o policiamento moderno remonta ao sistema de patrulhas de escravos e temos que ser claros sobre isso porque essa é a história, certo?

A branquitude foi criada para dividir e conquistar, para criar a noção de que mesmo embora você branco possa não ter muito, pelo menos você não é negro, pelo menos não é indígena, pelo menos você não é mexicano, pelo menos você não é chinês trabalhando nas ferrovias para construir a economia transcontinental. Você pode não ter muito, mas pelo menos você tem, como W. E. de Bois disse, o “salário psicológico da branquitude”.

É um truque que foi usado durante a era da Guerra Civil pelo meu povo no sul, gente rica, latifundiários do sul, para convencer brancos pobres que não possuíam nada de que eles tinham que sair e lutar para preservar a propriedade do homem rico – seres humanos.

Fascinante! Por que você faria isso? Por que eu iria lutar pela sua propriedade? Bem, porque você me disse que se eu não fizer isso, esses escravos vão tomar meu emprego. Não, seu idiota! Eles conseguiram o seu emprego! Se você cobra um dólar por dia para trabalhar, e se um dono de escravos pode fazê-los trabalhar de graça, adivinhe quem fica com o emprego? Não é você, com certeza!

Então na verdade o sistema de escravização apostava contra o interesse de classe de brancos da classe trabalhadora, mas eles conseguiram empurrar a idéia. Aconteceu a mesma coisa no movimento sindical branco. Aquelas pessoas não queriam pretos e pardos em seu sindicato porque isso “reduziria o profissionalismo do ofício”.

Não, seu idiota! Isso iria dobrar o tamanho do seu sindicato e depois quando você entrasse em greve os patrões não poderiam substituir o seu traseiro pelo mesmo povo pardo que você não queria ao lado! E o pior é quando você é substituído por eles, você os culpa – e não à elite!

Veja como isso funciona! É um truque que opera há centenas de anos. Está funcionando em algumas pessoas nesse instante, e é nosso trabalho resistir a isso com cada fibra do nosso ser.

Fim de samba

O samba acabou em choro. Depois do agogô deixar de ressoar, do pandeiro ser posto na parede, da viola ser guardada no saco, do couro do atabaque esfriar, vieram lágrimas. O samba acabou em choro, porque de há muito não havia outra forma de acabar. Há os sambas que acabam em gargalhada, nos quais o suor gruda na camisa e dos quais se sai com um sorriso que cabe um terreiro inteiro. Mas há também os que são sincopados demais, sambas de breque que vão brecando pela vida. Acelera, pára, acelera, pára. Um compasso se perde ali, a melodia azeda um tiquinho acolá. As lágrimas vão se formando nas solas dos pés, e à medida que se samba elas vão enchendo as canelas, coxas, cintura. Inundam o coração e finalmente vazam dos olhos. É um fim que se poderia ver de longe, se o sambista estivesse mais atento. E assim, quando o samba acaba, corre a água. O samba acabou em choro, mas foi um samba doce de se sambar. Escorregando e caindo, teve seu molejo. Deixa saudade no coração do sambador – saudade agridoce. Saudade do ponteado que se fez na viola, mas não daquela corda que se quebrou. Saudade daquele repicado que se fez no pandeiro, mas não do dia em que o pandeiro furou na beirada. O samba acabou em choro, e agora há um mar a se escoar por furinhos que mal cabem a corda mi do cavaco. O samba acabou em choro e agora é hora de limpar a mesa, arrumar as cadeiras, juntar os cacos da moringa. Desce o pano.

A estrada sempre segue

A estrada faz-se reta e faz-se curva. Corcoveia para cima, embarriga-se e ameaça jogar o motorista para fora. Vou devagar, vou depressa. Vou chutando pedras pelo caminho, vou correndo, vou deixando nacos de pele no chão quente, vou feliz como pinto no lixo, vou mais triste que cão sem dono. Mas vou, porque estrada é para se ir. A mão é uma só, não há retorno. Mas há desvios, e paradas obrigatórias, e quebra-molas e buracos. Não obstante, vou. Esperando que depois de alguma curva haja o pódio de chegada e o beijo da namorada. Mas ainda que não haja, ainda assim eu vou. Porque a pancada de hoje é a dor de amanhã, o hematoma da semana que vem, a cicatriz do próximo mês, a lembrança do próximo ano, a saudade da próxima década. O jeito é ir, porque não há tempo que volte.

A semana

A semana (Domínio público)

Sigunda plantei a cana
Terça manheceu nasceno
Na quarta fiz u engenho
Quinta manheceu mueno
Na sexta fiz a cachaça
Sábado manheci bebeno
Duming’acordei di ressaca
I sigunda recomecemo

Camaradinho

Méxi c’a cuia Mariquinha
Agora chegou mais um!
Méxi c’a cuia Mariquinha
Agora chegou mais um!

Jamais esquecer!

“Nenhum dia amanhece, para um escravo”, escreveu um negro liberto. “E esse amanhecer também não é buscado. Para o escravo, é sempre noite. Noite para sempre”.
Um nativo do Mississipi, branco, foi ainda mais direto: “Eu preferia estar morto”, disse ele, “a ser um crioulo nessas grandes fazendas”. 
Um escravo chegava ao mundo em uma cabana de um quarto e chão de terra, congelante no inverno e escaldante no verão. Cabanas de escravos geravam pneumonia, tifo, cólera, tétano, tuberculose. As crianças que sobreviviam o suficiente para serem mandadas para os campos aos 12 anos, tinham dentes podres, vermes, disenteria, malária. Menos de 4 em 100 chegavam aos 60 anos. 
O trabalho começava ao nascer do sol, e continuava enquanto houvesse luz. 14 horas, às vezes – a menos que houvesse lua cheia, pois então durava ainda mais. 
No quarteirão dos leilões, os escravos tinham que pular e dançar para mostrar a sua agilidade, e eram despidos para demonstrar quão poucas chicotadas precisavam. 
Os compradores os cutucavam e apertavam, examinavam seus pés, olhos e dentes. “Precisamente”, lembra um ex-escravo, “como um jóquei examina um cavalo”.
Um escravo podia esperar ser vendido ao menos uma vez em sua vida. Às vezes, duas; talvez mais. 
Dado que casamento entre escravos não tinha valor legal, os pastores mudaram os votos de união para “até que a morte ou a distância os separe”.
“Você sabe o que eu faria ? Se visse que ia ser escravo novamente ? Eu conseguiria uma arma e acabaria com tudo de uma vez por todas. Porque você não é nada além de um cão. Nada mais que um cão”.
Alguns escravos recusaram-se a trabalhar. Alguns fugiram. Ainda assim, os negros lutaram para manter suas famílias unidas. Criaram sua própria cultura sob as piores das condições. E ansiaram pela liberdade.

Você pode nocauteá-los!

O meu pai costumava dizer assim: “Você não pode vencer os brancos em nada. Nunca. Mas você pode nocauteá-los. Se você tiver 6 e ele tiver 5, ele vence. Se você é negro, não pode deixar a decisão ir para o juiz. Porque você vai perder. Não importa o quanto você tenha batido no outro [lutador]”. 

Larry Holmes versus Gerry Cooney é o exemplo perfeito da VIDA. Larry Holmes meteu a porrada no Gerry Cooney por 11 assaltos. Ele o nocauteou no 11o assalto, e a luta terminou. O Gerry estava sangrando muito, apanhou a luta inteira. Quando foram olhar as pontuações dos juízes, Larry Holmes estava PERDENDO a luta. Se ele não tivesse nocauteado o outro, teria perdido o título.

E essa é essencialmente a experiência do negro. Você é sempre negro, e sempre vai haver uma reação exagerada, de uma maneira ou de outra. Hahaha. A respeito da sua presença. Seja boa ou má. 

Só por deixarem o Jackie Robinson (primeiro jogador negro de baseball profissional, iniciou a carreira na liga principal em 1947) jogar, não quer dizer que o baseball é igual para todos. Estatisticamente, o baseball não foi igual até os anos 70. E por que eu digo anos 70? Porque, foi quando começamos a ver jogadores negros RUINS.

A verdadeira igualdade, é a possibilidade de ser tão ruim quanto o homem branco. Este é o sonho do Martin Luther King tornado realidade. É poder ser ruim.

Eu vejo as cerimônias do Oscar. Ok, essas são as pessoas que fizeram os filmes bons. Onde estão as pessoas que fizeram os filmes ruins ? Eles são a maior parte da indústria.

Eu quero ser como eles! Não que eu queira ser ruim. Eu quero a licença para ser ruim e ter a chance de voltar a atuar. A licença de aprender.

Voltando para o gueto ?

O GoogleTrends é uma ferramenta bacana: resumidamente, ele mostra gráficos que indicam o quanto uma palavra é pesquisada no Google. Isso se traduz no quanto essa palavra é interessante para as pessoas mundo afora, ao longo do tempo.
Por exemplo, o GoogleTrends foi utilizado para se detectar possíveis epidemias de gripe ou de dengue. Ao cruzar as pesquisas feitas no Google por “dengue” com a informação geográfica de onde as pesquisas são feitas, conseguimos desenhar mapas que mostram lugares do mundo onde as pessoas se preocupam mais com a dengue – provavelmente porque estão em risco.
Abaixo, a pesquisa no GoogleTrends sobre dengue, filtrada para o Brasil.

Mas… E onde entra a capoeira ?

Se pesquisarmos “capoeira” no GoogleTrends, o resultado é esse abaixo:

Os dados não mentem: de 2004 para cá, o interesse do mundo pela capoeira está diminuindo – ou pelo menos, as pessoas não estão pesquisando mais no Google.
Eu me lembro do início da internet no Brasil, que coincidiu mais ou menos com o meu início na capoeira (1996). O Google ainda não existia, e os mecanismos de busca eram bem ruinzinhos. Os primeiros sites sobre capoeira que me lembro de ter visto foram o do Abadá e a página web de um capoeirista chamado Escovinha – aluno do Mestre Marcelo Caveirinha.
Quando vi isso, tratei de criar uma página web para o meu grupo – treinava então com o Mestre KK Miraglia, no grupo Arte & Luta. Pouco tempo depois, por volta de 1999, o panorama da capoeira na internet explodiu – especialmente fora do Brasil. De repente, apareceram muitos websites ligados ao assunto, e o maior deles era o www.capoeira.com – no qual fiz grandes amigos dentro e fora do país.
O tempo passou, a água correu, e a capoeira se difundiu cada vez mais – ou será que não ? O que a pesquisa do GoogleTrends mostra é que a tendência a procurar por “capoeira” na internet está diminuindo.
Isso é reflexo de mais e mais pessoas querendo experiências reais ao invés de virtuais ? É reflexo das crises financeiras pelo mundo afora, que trouxeram muitos capoeiristas de volta para o Brasil nos últimos anos ?

Será que a capoeira está caminhando para se tornar “misteriosa” novamente ?
Quando aumentamos o escopo da pesquisa, vemos que o interesse pela capoeira angola também diminuiu:

Já a capoeira regional tem um interesse razoavelmente constante:

Comparando as duas simultaneamente, vemos a popularidade da angola decair com o tempo, embora ainda seja mais popular que a regional:

Já o nosso berimbau, está cada vez mais popular…

E você, o que acha ? Na sua percepção, a capoeira tem ficado menos popular com o tempo ?