Denominam-se escalas pentatônicas, em música, ao conjunto de todas as escalas formadas por cinco notas ou tons. As mais usadas são as pentatônicas menores e as maiores, que podem ser ouvidas em estilos musicais como o blues, o rock e a música popular. Muitos músicos denominam-na simplesmente de “penta”.
Escalas pentatônicas são muito comuns, e encontradas por todo o mundo, incluindo mas não limitadas a: música tradicional celta, música tradicional húngara, música do oeste da África, cânticos espirituais afro-americanos, jazz, blues, rock, canto sami joik, músicas infantis, músicas tradicionais gregas de Epirus, noroeste da Grécia e sul da Albânia, afinação do instrumento etíope krar, afinação do instrumento indonésio gamelan, do kulintang filipino, melodias da Coréia, Japão, China e Vietnam (incluindo músicas populares destes países), tradição afro-caribenha, montanheses da Polônia e compositores clássicos como o francês Claude Debussy. A escala pentatônica é também utilizada nas gaitas de fole escocesas.
Bacana, né ? Agora veja o vídeo.
Ao final, o sujeito (Bobby McFerrin) comenta que “ele já fez esse tipo de performance em diversos lugares do mundo, e em qualquer deles a platéia “pega” a idéia do mesmo jeito”.
É como se o nosso cérebro humano estivesse “programado” de nascença a entender escalas pentatônicas. A música unindo o mundão sem porteira…
E falando nisso, sinta o peso desse som aqui (projeto “Playing for change” – uma única música gravada por gente do mundo todo, tudo-ao-mesmo-tempo-agora):
Gunga bateu ! O povo da rua se achega, as crianças vem brincando pelas esquinas – balançando matos e revirando papéis velhos. Pássaros nos beirais se olham intrigados, sem saber de onde vem o chamado. O gato velho levanta as orelhas, sem ter certeza se ouviu seu nome. Gunga bateu ! A cachorrada se assanha, aqueles presos em coleiras invejando os que correm soltos na direção do som. Os cavalos vão se aproximando para vadiar. O arame segue falando, abrindo as portas e trazendo todos para perto. O arco é colorido, arco-íris entre céu e terra, chamando os de longe para perto. Gunga firmado, chega o roseiro, e vai contrapondo seu som – um gemido não tão sério quanto o de seu irmão mais velho, mas ainda assim fazendo com que os viventes tentem entender de onde vem cada arrepio. O toque tem cadência, é pesado – quase sólido, e segue batendo. Dim-dom-dim, dim-dom-dim, berimbaus bateram ! Quem está prestando atenção, mal levanta os olhos, tal a indolência ritmada. Viola chega por último, magrelinho e risonho. É uma verguinha, uma cabacinha, um fiozinho de arame. Mas da boca só lhe sai o que tem nas entranhas, e é alegria pura… Para quebrar o siso dos mais velhos, para impor um pouco de caos à ordem. E vai gritando – hora que sim, hora que não. Dim-dom-dim, dim-dom-dim, tríade formada, berimbaus bateram ! Pandeiro abre um olho, depois o outro. Vê o povo da rua em volta, gatos, cães, pombos, cavalos à espera. Vê cada morceguinho que observa de cabeça para baixo, escondidinho na sombra da mangueira. Pandeiro fala, e cada joelho da praça se balança. Cutuca seu irmão, também pandeiro, e lá vão os dois candongando. Tum-tá, dim-dom-dim – velhos conhecidos se reencontram, e lembram dos tempos antigos. Ingoma acorda mal-humorado. O couro de boi quer correr de novo em savana, e se deleita no lambuzo de dendê. Ingoma é atabaque, tambor que lembra do tempo da chegada, e tem saudade. TUM-TÁ-TUM, fala alto e um ou outro passarinho tem saudade de casa e voa para longe. Um cachorro se lembra do quintal onde cresceu, e gane baixinho. TUM-TÁ-TUM, tum-tá, dim-dom-dim, a bola de neve vai descendo o morro. Reco-reco vem de fininho, e começa a se esfregar, e é de uma quentura tão quente que os pés de todos se esfregam no chão, saltitando. O gato velho tem certeza de que alguém lhe chamou, e chega mais perto. O ferro observa a tudo, a tudo vê. Uma boca fala, outra boca fala, dim-dim-dom-dom-dom-dim-dim. O sol parece tremer por um segundo, enquanto o ritmo oscila para cima e para baixo – cavalo corcoveando no pasto, a espera de cavaleiro. O ferro segue gritando, falando da mina, da terra, do escuro do fundo do chão, do barro que fez homem e faz casa. Rei vindo de longe, agogô é ferro, e chama quem ainda não veio. E chega um, para comer antes de todos. E depois do um, outros, muitos outros. Dim-dom-dim, TUM-TÁ-TUM, tum-tá !
Antônio Laurindo das Neves começou a jogar capoeira em 1918. Segundo palavras dele mesmo, “aprendeu a tocar e a jogar observando os outros” (ouça a entrevista aqui http://www.youtube.com/watch?v=_EQbRlEzAOk ).
Antônio Laurindo das Neves cresceu para se tornar o Mestre Totonho de Maré, celebrado até os nossos dias como um dos grandes da capoeira. Quem nunca ouviu “Eu conheci Canjiquinha, também Mestre Bimba, também seu Maré” ?
Mas e hoje em dia, um capoeirista aprende a jogar só de olhar e ouvir ? Há quem diga “se o Mestre Maré não teve mestre, por que eu preciso ter ?” Não posso freqüentar rodas, observar e aprender ? Não posso comprar DVDs e CDs de capoeira, e também ser bamba ?
Respondendo a minha própria chamada, resumo a problemática numa palavra: contexto. Maré via e ouvia, mas provavelmente também conversava com os capoeiras, respirava ares cheios de informação e mandinga. Será que freqüentava as docas e as áreas da malandragem, da cafetinagem ? Será que se envolvia em “barulhos” onde precisava se por à prova ? Na entrevista citada acima, ele menciona uma briga com um companheiro, por causa de um revólver.
Eu entendo que Antônio Laurindo das Neves não teve um mestre – teve vários. E o maior deles, a própria vida num ambiente de malandragem (como diz o Mestre Toni Vargas, “se não fosse malandro, nem crescia“). Talvez daí o seu nome: Maré, ilha da Baia de Todos os Santos. Um baiano cercado de capoeira por todos os lados.
O depoimento do Mestre Caiçara foi tomado pelo Mestre Matiole, durante o Encontro Nacional de Capoeira de Ouro Preto, promovido em 1987 pelo Mestre Macaco e o Grupo Ginga (de Belo Horizonte).
O símbolo [???] indica um trecho do áudio que não consegui transcrever. Entendimentos e sugestões são bem-vindos.
Mestre Matiole: Ô mestre, o senhor falou que a cobra mordeu o senhor e ela morreu, né ?
Mestre Caiçara: É, se morder, morre. Por causa do veneno. Cobra mordeu Caiçara e morreu, cobra mordeu Caiçara e morreu. Aí diz “Ai ai, aidê ! Joga bonito que eu quero aprender”, quando tu tá querendo dizer que eles são burros. Tu diz assim: diz “Ai ai, aidê ! Joga bonito que eu quero aprender”. Tá dizendo que ele é burro, né ?… [???] Tô aqui esses dias, agoniado.
MM: De saudade…
MC: Ih…
MM: O senhor tem muito neto ?
MC: Filho… Trinta filhos.
MM: E os netos ?
MC: Vinte e dois.
MM: Vinte e dois netos…
MC: E doze bisnetos.
MM: Doze bisnetos…
MC: [???] Eu tenho uma filha [???] Ela não tem comido mesmo. Eu como assim mas… meu pensamento é nela.
MM: Dois anos…
MC: É. Quando… De manhã cedo eu acordo, eu tenho uns passarinhos. Tenho um pássaro-preto, tenho um [???] bicudo, curió, tenho cardeal, tenho cabocolinho, tenho chorão, tenho um papagaio, tenho um papa-capim, tenho um… um pracinha, tenho um azulão. Mas quando chega de manhã que eu acordo para poder… Para [???], eu acordo, ela acorda e fica assim… Tem dois anos ! “Papai, papai, papai”
MM: Dois anos ela tem ?
MC: É. “Papai!”, e me toma a bênção. Eu aí que posso limpar os passarinhos. Aí pronto. Dali, ninguém, ela nem que ponha o [???] dela, fazer xixi, e aí “Papai, xixi!”. Aí fica mostrando assim a máquina, e aí [???]. E eu limpando os passarinhos. Não gosto nem de falar…
MM: Passarinho então, o senhor gosta de passarinhos, mestre.
MC: Gosto… Sou louco por passarinho.
MM: Mestre, e na música da capoeira, o senhor tem músicas do senhor mesmo ?
MC: É.
MM: O senhor tem músicas que o senhor…
MC: Todas que eu canto, é minha.
MM: Todas, do senhor. Aquele disco, por exemplo, que nós conhecemos, da academia…
MC: É. É todas nossa.
MM: É “Unidos…” Como é o nome do disco, mesmo ?
MC: É… Academia de Capoeira Angola São Jorge dos Irmãos Unidos do Mestre Caiçara. Agora mesmo eu vou gravar outro disco, depois do carnaval.
MM: Músicas do senhor, né ?
MC: É.
MM: O senhor mesmo faz as letras…
MM: Então aquelas músicas, grande parte é do senhor.
MC: É. Não ! Grande, não ! Todas ! Até a que a mulher canta, eu que mandei ela cantar. Porquê sempre tem que botar mulher no meio… Eu tava limpo, sem dinheiro, ela me botou na gravadora lá em São Paulo. É… Aquela gravação da “Mangueira”… “Alô, Bahia…”
MM: Os discos… Zé Maria pinta muito na casa dele, ao som daquele disco do senhor…
MC: É. MM: Mestre, e as mulheres ? Fala para a gente das mulheres.
MC: Ah, mulher… Para que coisa melhor de que mulher ? Só duas. Eu gosto tanto de mulher, que eu gosto da vida. Que a vida é fêmea. Hahaha. Para que melhor que mulher ? Só duas ! Tem um sambinha que eu fiz que diz assim: “Emburané, emburaná, imbigada batida, jatobá ! Imbigada batida, só no imbigo, homem com homem, mulher comigo ! Botão de ceroula que faz o [???], no bulir das cadeiras, que mata nós !” Ele gosta… Hahaha. Ê menino relaxado, vem com o mestre. Hahaha.
Brasil nosso Brasil Ó Patria do amor Do teus filhos és mãe gentil Nasci em Salvador A capoeira por todo Brasil No momento de festa, ou de dor Capoeira aos mil Encontra-se em Salvador.