É quando se retesa o arco e se estica o arame; é quando a baqueta corta o ar e faz vibrar a cabaça; é quando se esquenta o couro com a palma da mão, e o suor corre em bicas. É quando o gunga grita e a função se desenrola; é quando no campo de mandinga, dois viram um. É quando a boca canta sozinha e quando o corpo vai sem rumo, cavalo sem cavaleiro que se veja – é justo nesse momento que estou vivo, uno com todos e ao mesmo tempo só. Vivo quando a perna passa e o tronco esquiva, quando os braços negaceiam. Vivo quando a tesoura derruba, quando rasteira de fraco põe forte no chão. E nesse balanço, nesse remelexo, nesse pega-não-pega, vou vendo siri dar em caranguejo, gavião apanhar de bem-te-vi. E quando o samba mexe meus joelhos, também estou vivo – escorregando, caindo, tretando, presepando, levantando, de banda, de lado, entortado, de viés. E aí, sacudido, balançado, tremelicado, pulsado, febril de jogar o jogo, de brincar a brincadeira, descanso. Uma pequena morte, diria – até que a vadiagem me faça viver de novo.