“Meu apelido, Cobrinha Verde, quem botou foi o próprio Besouro, meu mestre. Porque eu era muito veloz. Eu era tão ligeiro que um dia ele me botou no quadro prá jogar facas em mim, prá ver se eu sabia me defender. Eu peguei as facas 2 vezes”.
“Quando Besouro ensinava aos seus discípulos e via que o aluno estava preparado, ele fazia esta experiência: se fechava numa sala com o discípulo, metia a mão num punhal e dava outro ao discípulo e dizia: vamos trocar facas com uma toalha amarrada na cintura dos dois, prá um não fugir do outro.”
“Enfrentei prá não morrer. Se corresse eles me matavam. Então eu enfrentei para não morrer (…) Meti a mão no facão, e eles com aquelas pistolas 320. Aí eles lutaram (…) e não puderam comigo. (…) Deram 18 tiros. E eu, pulo de um lado, pulo do outro. Quando olhei só tinha dois na minha frente. Os outros dois estavam estirados no chão. Aí, esses dois correram e eu corri também. Acabou a briga”.
“Aqui em Salvador, não posso fazer as contas dos alunos que já tive. Mesmo porque são tantos que eu não me lembro. Comecei a ensinar primeiro que Bimba, Pastinha… Eu saía da Fazenda Garcia prá dar instrução a Bimba e a judar ele a dar instruções aos seus alunos, no Bogum, Engenho Velho da Federação.”
“Depois tinha uns amigos mestres. Mestres não, eram capoeiristas, porque naquela época não tinha academia. (…) Marola, Augusto Chibateiro, Barbosa, Aberrê, João Macaco, Paulo Bolão, Antônio Corró, Otaviano, Roque Barroso, Barriga Pequena, Menino Gordo, Antônio Catité, Waldemar Geraldino. Eles iam jogar comigo com medo, mas eu não batia em ninguém.”
“Não era só com a capoeira que eu me livrava dos meus inimigos. O bom capoeirista é mágico. Ele tem o poder de aprender boas orações e usar um bom breve, porque a capoeira não livra a gente de bala. Então, eu usava um bom breve e boas orações. Hoje não uso, mas eu não estou esquecido. Está tudo aqui na cuca. As orações eram para me livrar dos malignos e de balas”.
“O breve que eu usava tinha oração de Santa Inês, de Santo André, de Sete Capelas, tinha Sete folhas. Depois que eu usava, botava ele em cima da mesa num prato virgem. Ele ficava pulando, porque era vivo. Mas houve algum problema, pois ele fugiu (…) de mim. Foi algum erro que cometi e ele foi embora e me deixou. Quando entrei no bando de Horácio de Matos com 17 anos eu já tinha esse breve”.
“Quem me deu esse breve foi um africano (…). Ele se chamava Tio Pascoal. (…) Um dia ele me disse: é, tu és um menino destemido, vou te dar um negócio. Só Deus é quem pode te fazer uma traição. Deus não faz traição, meu filho, com ninguém. Agora o que eu vou te dar, tu tens que usar como te ensinarei. Eu respondi: sim senhor”.
“Fui um homem que tinha família mas não dormia com a patroa. Ela dormia lá e eu dormia cá para não quebrar as minhas forças. Eu não passava debaixo de cerca de arame, não passava debaixo de pé de dendê, não passava debaixo de cooité. Se fosse passar por aqui e aqui estivesse uma corda de roupas eu ão passava por debaixo nem as quartas-feiras nem aos sábados”.
“Em épocas passadas eu gostava de andar na turma dos veteranos daqui de Salvador. Eu não estou desfazendo porque nunca desfiz. Mas eu nunca ouvi falar em Pastinha. Nunca, só depois da morte de Aberrê. Antes de Aberrê morrer, Pastinha andava acompanhando Aberrê. Depois foi que Pastinha andou tomando conta de academia e dizia que foi mestre de Aberrê. Aberrê nunca me disse quem foi o mestre dele.”
“A capoeira não conta golpes, porque a capoeira tem muitos golpes mortais. Eu digo que na capoeira angola tem golpes mortais, porque se você pegar o adversário no golpe mortal, quando soltar ele não levanta mais”.
“A capoeira angola é uma luta. A primeira do mundo. É original, por isso ela não tem disputa. Não pode. Dois angoleiros que entendem da luta não podem disputar porque na luta mesmo um quer vencer o outro e um pode aplicar um golpe mortal”.
“Os alimentos de hoje em dia são todos podres. Se é o peixe, leva 2 meses no gelo Até a própria farinha já perdeu a força. Na minha época, comia farinha tirada do forno (..) Sabe como fui criado ? Meu leite era polpa de jirimum com mel. Viajei pelo sertão e levei 20 anos comendo tudo vivo. Era abóbora com leite, batata, era um boi matado na hora, carne viva tremendo prá botar no fogo”
“(…) eu me defendi de muitas coisas, mas não foi só com a capoeira não. A capoeira para aqueles angoleiros velhos tinha a magia dela. (…) A magia da capoeira é aquela que dedica a botar uma fava-da-índia no bolso, a usar um bom breve e boas orações. Então, eu só estou avisando, prá ninguém confiar só na capoeira prá lutar”.
“Eu não posso dizer nunca que tenho a capoeira como esporte. Eu tenho como uma luta, defesa pessoal. De muitas coisas eu me defendi com minha luta. Eu me defendi de faca, me defendi de facão, me defendi de cacete, de foice. Até de bala eu me defendi (…) Então, eu não posso nunca ter como esporte, não posso levar como esporte, só posso levar como luta”.