Não se pega água com peneira, e nem vento com a mão. Capoeira é água de correnteza, que vai molejando entre as pedras e chega onde quer – se infiltrando onde há caminho e quebrando onde não há. Não tem forma, nos forma. É vento que refresca o couro e vendaval que derruba gameleira. Capoeira é de esquentar o chão e o coração, é febre de dar tremedeira, é alegria de pregar sorriso no rosto de quem vê. É a conta do ódio do oprimido, do alívio do liberto, da perseverança do fujão. Manha, mandinga de escravo, magia, mistério. Poesia de quem quer, história de quem sabe e viu e ouviu. Ancestralidade, respeito pelo que foi e atenção no que vai ser – para não errar os mesmos erros. Capoeira é música que não cabe na garganta, e que quer barulhar no mundo. Tambor tocado com delicadeza e força, arco retesado e soltando flechas de som. Sino de ferro feito em forja, couro de bode afinado com fogo. É aço que canta, chocalho que chia, cabaça que geme, coração que bate em ritmo negro. Capoeira é o sal, o sol e o céu. O boi, o louro, o mel. O café, a cana, o ouro. O suor, o sangue, as lágrimas. O calo, a ferida, a mágoa. A ofensa, a vingança, o perdão. A luta, a fuga, a emboscada. O pé, a mão, a cabeça. Não é preciso definir capoeira – a capoeira é.
De quem [e isso? Este poema! Muito lindo!
Esse é meu mesmo, camarada!